VIVER TERESINA

É um espaço destinado a colher informações e a divulgar a poesia contemporânea brasileira, a tradição poética nacional e a vanguarda internacional. Historiadores e ensaístas poderão publicar também textos sobre a história do Brasil. O nome Viver Teresina é uma homenagem a um movimento literário criado pelo escritor Menezes y Morais nos anos 70 em Teresina.

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sexta-feira, 11 de junho de 2010

UMA BALADA PARA FELICIANO, VERÔNICA E PARA O ANJO GABRIEL







A Casa de Detenção de São Paulo é bem maior do que imagina a minha vã consciência.
Nem sei se é isso mesmo ou se é mais ou menos esso.
A Casa de Detenção de São Paulo começa nos arredores da cidade de S. Paulo
lá naquele oceano de nuvens sob o qual se vê as favelas e os out-doors coloridos.


Na Casa de Detenção de São Paulo as grades são visíveis a olho nu.
Chama a atenção do transeunte mais abobalhado, a feroz sina da alienação. Mas dando dois passos para frente e um para trás,
eu estava dizendo que a Casa de Detenção de São Paulo começa lá naquele oceano de nuvens sob o qual se vê as favelas que circundam a cidade de São Paulo com seus out-doors coloridos
e os moleques travessos que soltam pipas neste raro céu todo azul.


A Casa de Detenção de São Paulo começa no lugar onde menos se espera.
No ponto de ônibus, no bar, numa roda de amigos, no farol, na faixa para pedestres,
no trabalho, no elevador, no botequim da esquina, nas relações amorosas,
no lixo dentro do luxo, no luxo dentro do lixo, no cão fila do banco,
no desfile gay, na voz machista do cantor sertanejo, no tudo e no nada.


A Casa de Detenção de São Paulo é como uma teia de aranha.
Qualquer toque acorda a aranha,
porque ninguém sabe onde começa o fio da honestidade
nem onde termina a teia da ganhação.


Nem se sabe ao certo o tamanho da Casa de Detenção de São Paulo
porque a perfeição, aliás, a liberdade é a meta a ser atingida pelo goleiro,
ou melhor, a liberdade é a meta a ser atingida pelo preso
que mora na Casa de Detenção.


Mas ele não vê que lá fora outras grades invisíveis como teias invisíveis
de uma aranha invisível, de um tempo invisível
cobrem toda a cidade de São Paulo, com seus carros apressados,
homens e mulheres apressados sem saber onde estão,
nem o que são, nem para onde vão,
a não ser aquelas mãos estendidas dos presos
pelas grades da prisão porque a meta do preso que mora na Casa de Detenção é a liberdade que ele vê lá fora e que os meus olhos lacrimejantes
não conseguem enxergar de tanta dor e de tanta alegria;
Estou com fome mas tenho medo de descer os dez andares
que separam os meus pés do chão.


Por isso, imagino meu corpo voando como uma carruagem de fogo
pelo céu da cidade de São Paulo, desde aquele lugar de onde começa a cidade de São Paulo, com suas favelas e out-doors coloridos, tendo como mar um oceano de nuvens de um céu raro todo azul em que voam as pipas dos moleques travessos


que brincam com vermes dos esgotos como se fossem brinquedos eletrônicos, até aquela avenida cercada de carros apressados por todos os lados,
u num vôo rasante no meu tapete mágico pela avenida Paulista
lugar em que a sede do lucro a cada centímetro mata mais do que as doenças dos campos gerais
com homens e mulheres apressados sem saber de onde vieram, o que são e para onde vão as suas almas, que os meus olhos lacrimejantes não conseguem enxergar de tanta lágrima e de tanta alegria.


A Casa de Detenção de São Paulo é uma torre de babel invertida para o centro da terra,
lá naquele lugar em que moram os demônios da garoa,
parecido com um mar de enxofre, onde inocentes culpados pagam os pecados de toda tribo.
separada tão longe e tão perto de mim pelos dez andares
que separam meus pés do mesmo chão onde homens e mulheres apressados não sabem para onde vão.


Chico Castro - São Paulo, 05/032001


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